Refugos
Nem tudo o que é velho é imprestável ou
desprezível de per si. De quase tudo se pode fazer algo novo, reciclando
utilidades, refazendo percursos e recriando expectativas. Só acaba de vez o que
nunca teve qualquer serventia. Mas se tudo tem um propósito, isso é muito
difícil de acontecer, já que tudo tem sua serventia. Por isso eu tento renovar
a minha vida diariamente. A intuição me confere
discernimento. Cultivo a serenidade diante da transitoriedade. Planto
persistências. Depuro e capino o mato daninho do desprezo e do isolamento. E
tudo isso para tentar fazer do eventual traste inútil que amanhece em meu
pensamento um voto de resiliência. Que seja para um talvez, para um amanhã
possível, para alguma conquista, mesmo que distante... Seja para uma quimera
qualquer. Por isso eu digo que velho não vira refugo. Na verdade ele virará pó,
quando chegar sua hora.
Horizontes
Certa vez perdi o
medo de horizontes. Então passei a sentar-me na beirada dos dias e a ficar
mirando o decote das tardes. Imaginava o lá longe. Tinha dias que era mar, mas
eu nunca cheguei a ouvir o chiado do sol mergulhando nele. Mas ele se alaranjava e lá mergulhava, num
silêncio de nada se ouvir. Só depois é que vinha a voz de alguma estrela. E
tinha outros dias que era no vão dos seios das montanhas, bem no lá longe, que
o sol ia dormir. Que haveria por lá? Eu
mirava aquilo tudo que não entendia direito. Mas já não tinha medo. Pois se era
para lá que o sol ia toda tarde e sempre voltava no dia seguinte, para que ter
medo de horizontes?
Passagem
Não há perenidade nas questões de tempo. Daí as coisas eternas serem às
vezes incompreensíveis. Tempo é o que existe entre o começo e o fim de um
ciclo. A vida dura a fração exata entre nascimento e morte. E sempre haverá tempo justo para semear e
colher, matar e curar, nascer e morrer, rir e chorar, abraçar e se afastar de
abraçar. Assim, não há razão para que seja preciso usar a hipocrisia para
enganar com o riso, quando for o tempo de chorar, nem de abraçar efusiva e
falsamente apenas quando houver algum momento de passagem.
Agradecimento e respeito
Há que se ter a consciência de que o novo também será tão efêmero e
breve quanto o que já se foi. Daí a razão de tentar ser justo e perfeito com
cada segundo de nossa existência. A tudo é preciso dar valor e tratar com
respeito, pois cada breve segundo pertenceu ou pertencerá à fração de vida que
nos cabe. Agradecer e respeitar, ao velho que nos proporcionou o que já
tivemos. Agradecer e ter esperança que possamos merecer o novo que se espera. E
assim vai a efemeridade do tempo. Quanto às coisas perenes ainda temos muito a
aprender.
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Apresentado na Pizza Literária da SOBRAMES-SP
19.12.2013
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19.12.2013
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Um comentário:
MUITO BOM......GOSTEI....CONTINUES
BOA SAUDE E MUITO MAIS NESTE 2014.
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