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21.1.17

Estudos nada científicos sobre a temperança


         Tenho sido um eterno aprendiz. Em todos os sentidos e em tempo integral. Contudo, e em vários momentos, a vida me diz algo intrigante, ou pelo menos desconfortável. É mais ou menos assim:  "você ainda não aprendeu isso direito, rapaz!".  E lá vou eu, buscar os motivos, analisar prós e contras, reaprender, enfim, ver onde foi que errei para que algo não tenha dado certo antes. Fui rever alguns conceitos pessoais e lembrei-me da velha e boa temperança.
            Refletir a temperança hoje em dia é um baita de um desafio. A palavra é quase uma incógnita, pois desapareceu do vocabulário do homem médio moderno, assim como do vocabulário da tal de “elite” intelectual, além daquela que se diz laica e, surpreendentemente, daquela que se autodenomina religiosa. Acho que temperança ERA uma virtude, pelo que cheguei a ler, estudar e apurar. Hoje em dia já não sei mais do que se trata, e que Deus nos ajude daqui pra frente!
            Temperança significava ter moderação, equilíbrio e parcimônia em nossas atitudes. Pelo que já apurei anteriormente, a palavra deriva do latim “temperantia”, que quer dizer “guardar o equilíbrio”. (Que o Grande Arquiteto do Universo me ilumine deste ponto em diante, para que eu não me destempere!) Quem faz isso hoje em dia? Esse substantivo feminino que nomeia a qualidade ou virtude de quem atua comedidamente, com prudência, sem a prática de exageros, está em pleno desuso. Senão, completamente extinto. Quem, hoje em dia, tem controle sobre as paixões, tem sobriedade em suas atitudes e decisões, evita os excessos em seus apetites, seus desejos e vontades? Vade retro, temperança, que isso não te pertence!
            Ela, que já chegou ao nobre status de virtude, pertencendo inclusive à nobilíssima classe das cardinais, com o fito de enaltecer a prudência, a fortaleza e a justiça, encontra-se atualmente prostrada no porão do império de malfeitores dissimulados e impolutos, insensíveis mandatários dos reinos de por aí afora. Um bando de usurpadores e assassinos tratou de dar-lhe uma sepultura nada decente nas masmorras do vício em que eles, os indignos mandatários, estão metidos. Ah, Senhor! Dai-me o auxílio da temperança para que eu não blasfeme de agora em diante!
            Temperança é o autocontrole, a renúncia e a moderação. A temperança precisa  domesticar os instintos, sublimar as paixões, moderar os impulsos e apetites. Agir com temperança é abrir caminhos para a sobriedade e o desapego. A temperança leva ao caminho para o cumprimento dos deveres e para a maturidade. E esses filhos de (...) ninguém que se dizem mandatários não percebem isso... (Ah, Grande Arquiteto do Universo, ensinai-me novamente, pois da temperança acho que quase nada aprendi. Ando sem paciência, sem tolerância e praticamente sem esperança... Querendo dar porrada nos usurpadores, embora sentindo-me sem forças para isso. )
            Sinceramente, eu não gostaria de parecer apenas um símbolo, tal qual um arcano do Tarô, passando a água de um vaso para outro, como a querer purificá-la com esse gesto de vai e vem perpétuo. Sempre, quando tiver que exercer a temperança e praticá-la, eu gostaria muito que a simbologia do Tarô e a virtude todinha que a temperança representa se materializasse. Especialmente em mim e também em certas outras coisas e pessoas.
            Não vejo relação alguma, exceto a lógica anteposição, entre certas virtudes e certos vícios, mas de pronto acredito piamente que, por exemplo: vaidade, ganância e avareza são dejetos, sujeiras, merda mesmo e não combinam nunca com qualquer virtude, muito menos com a temperança, que eu pessoalmente tenho como uma das boas virtudes. Como pode o avarento e ganancioso ser piedoso, generoso ou caridoso? Como pode o egoísta e vaidoso ser gentil e complacente com os que estejam brilhando mais que eles? Entende qual é ponto? É meio sutil, mas existe. Pois é.
            Eu não tenho a mínima intenção de ser dono de qualquer verdade, pois meu aprendizado é parco e insuficiente. Só quero que me seja permitido ir para a praia no próximo fim de semana, e que haja sol em alguns momentos, e que as pessoas que eu encontrar estejam felizes e convencidas de que o melhor que têm a fazer é tomar uma caipirinha bem feita, com o pé na areia, sem culpa e sem a neurótica necessidade de ter  apitos de alarme para as ameaças que nos afligem no dia a dia. E que o Senhor, Grande Arquiteto do Universo, seja sempre justo e perfeito com tudo e com todos, cada qual no seu pensar e cada qual no seu modo de agir! E que cada um faça sua parte na construção de seu templo pessoal e especialmente no templo da humanidade da qual ele faz parte e pela qual tem que lutar. E que cada um pague pelo seu vício, na legítima proporção de suas faltas. E que cada um receba suas benesses da forma que lhe couber. E que assim seja!

*** 
Publicado na coletânea "A Pizza Literária - décima quarta fornada" 
Rumo Editorial - SP - 2016

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