3.4.06
Tipóia
Era tão comum ver aquele homem na mesma esquina, pedindo. Esperava os carros pararem no sinal, e vinha com a cara compungida e uma das mãos esticadas. Assim como todos. Tão rotineiramente comum ver aquele homem de cabelos esbranquiçados. Mecânico o gesto. Automática a resposta, balançando a cabeça em negativa. O que é uma moeda? De dez ou de um centavo, que seja? Depende de quantas vezes é preciso dá-la. Ou negá-la.
Foi assim com o homem, pra lá de meia idade, cabelos gastos e meio amarelados. Um dia algo chamou atenção. O braço! Sim, agora ele tinha o braço direito na tipóia. Mas como assim, o direito? Não era o outro braço na semana passada? E desde quando a tipóia?
Numa manhã carrancura de final de verão deu pra ter certeza. O sinal tava meio demorado e o temporal, totalmente fora de hora e propósito, despencou sem muito aviso. De repente. Correram os pedestres em busca de um abrigo. Correu um moleque que vendia balas. Correu o velho de cabelo encaracolado e meio amarelecido pelo tempo. A primeira coisa que o vi fazer foi largar o braço de sua tipóia. Correu lépido para a marquise da loja de colchões.
Na hora do aguaceiro o engodo só atrapalhava.
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